sábado, 6 de outubro de 2012

A MUDANÇA DO HÍFEN COM O NOVO ACORDO ORTOGRÁFICO




DÉBORA BRAGA PRADO


            Este artigo apresenta as mudanças que ocorreram com o novo Acordo Ortográfico entre os países lusófonos em relação ao hífen.
            O objetivo dessas mudanças é facilitar o emprego do sinal gráfico, cujas regras estão entre as mais complexas da norma ortográfica.
            Utiliza-se o hífen em palavras compostas e em locuções:
a)      Para separar as palavras no final da linha
b)      Para separar elementos de palavras compostas por justaposição. Beija-flor, Porto-Alegre.
Em alguns compostos perdeu-se a noção de composição, ou seja, mesmo não sendo separados por hífen, os elementos mantêm uma identidade fonética e, por isso os dois elementos se aglutinaram como se pode observar em girassol, que é grafado com ss, a fim de manter o som do s inicial (sol).
c)      Nos topônimos,ou seja, nos nomes de lugar iniciados pelos adjetivos grão ou grã, por formas verbais, ou que tem elementos ligados por artigo. Baía de Todos-os-Santos,Grã-Bretanha.
d)     Nos nomes de espécies botânicas e zoológicas ligadas ou não por preposição ou qualquer outro elemento. Andorinha-do-mar, couve-flor.
e)Nos compostos iniciados pelos advérbios bem e mal seguidos de palavras começadas por vogal ou h. Bem-aventurado, mal-humorado.
O advérbio bem pode ou não aglutinar-se com a palavra seguinte, ainda que iniciada por consoante. Bem-falante, benfeitor.
f) nas palavras com os prefixos além, aquém, recém e sem. Além-mar,sem-                                  vergonha,recém-nacido                                                                                                     g) para unir duas ou mais palavras contextualmente combinadas. Liberdade-Igualdade-Fraternidade.
            Não se utiliza o hífen nas locuções:
a)      Substantivas: fim de semana, sala de jantar.
b)      Adjetivas: cor de vinho, cor de mel.
c)      Pronominais: cada um, quem quer que seja.
d)     Adverbiais:à vontade, à vista.
e)      Prepositivas: abaixo de, a fim de.
f)       Conjuntivas: a fim de que, ao passo que.

Prefixos que aceitam o hífen:
Utiliza-se o hífen nos compostos que começam com prefixos gregos e latinos.
Ante-, anti-, auto-, circum-, co-, contra-, entre-, extra-, hiper-, infra-, intra-, pan-, pós-, etc;
a) quando o segundo elemento começar por h. Anti-higiênico, pan-helenismo.
Obs.: Não se usa hífen nos compostos com os prefixos in - e des-. Desumano, inábil.
b) quando o prefixo termina com a mesma vogal com que começa o segundo elemento. Anti-ibérico, auto-observação.

Exceção: O prefixo co-, que se aglutina com outro elemento iniciado por o. Cooperar.
c) com os prefixos circum- e pan-, quando o segundo elemento começar por vogal, m, n, além do h referido anteriormente. Circum-navegação, pan- africano.
d)com os prefixos hiper-, inter-, super-, quando o segundo elemento começar por r. hiper-requintado, inter-residente,super-revista,
e)com os prefixos ex-, sota-, vice-, vizo-.Ex-aluno,soto-mestre,vice-presidente,vizo-rei.
f) com os prefixos tônicos acentuados gráficamente pós-, pré-, pró-, quando o segundo elemento tem vida à parte. Pós-operatório, pré-escolar,pró-europeu.
Não se utilizará mais o hífen:
a)      Quando o segundo começa com s ou r, devendo ocorrer a duplicação dessas consoantes, como em “antirreligioso”, “contrarregra”. Exceção: será mantido o hífen quando os prefixos terminam com r-, ou seja, “hiper-“,”inter-‘ e “super-”, como “hiper-requintado”, “inter-resistente” e “super-revista”.
b) quando o prefixo termina em vogal e o segundo elemento começa com uma vogal diferente, como “extraescolar”, “aeroespacial”, ”autoestrada”.
Quando o primeiro elemento finalizar com uma vogal igual a do segundo elemento, hífen deverá ser utilizado, como nas palavras “micro-ondas” e “anti-inflamatório”.
Sufixos que aceitam o hífen:
Nos compostos por sufixação, só se emprega o hífen nas com os sufixos de origem tupi-guarani  -açu, -guaçu, -mirim se o primeiro elemento termina em vogal acentuada graficamente e se a pronúncia exige a distinção dos dois elementos. Amoré-guaçu, cajá-mirim, capim-açu.

                              REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BECHARA, Evanildo.Moderna gramática portuguesa. Rio de Janeiro: Lucerna, 2004.
DE NICOLA, José, 1947-Gramática contemporânea da língua portuguesa/José de Nicola, Ulisses Infante - São Paulo: Scipione,1997.
MAZZAROTO, Luis Fernando. Redação: gramática e literatura.DCL:São Paulo, 2000.
            PEREIRA, José. A Nova Reforma Ortográfica. Disponível em internet:       http://www.filologia org. br . Acesso em 04/04/2008

MUDANÇA DA ACENTUAÇÃO GRÁFICA DAS PALAVRAS PAROXÍTONAS COM O NOVO ACORDO ORTOGRÁFICO



                                                                            TATIANE RODRIGUES MELO
                                                                  
A razão da escolha do assunto como tema deste artigo foi o fato de consideramos o assunto extremamente atual e importante, visto que as mudanças decorrentes do novo acordo ortográfico afetarão todos os países de língua portuguesa, seus sistemas educacionais e seu setor cultural, aumentando em muito o intercâmbio cultural entre os países pertencentes à comunidade lusófona e propiciando uma maior difusão da produção cultural dos países de língua portuguesa no mercado internacional. A unificação da ortografia faria com que tivéssemos uma norma culta escrita única, dificultando, sobremaneira, esse processo de dispersão da língua portuguesa.
Da acentuação gráfica das palavras paroxítonas: Definem-se as palavras que recebem acento agudo e circunflexo; bem como as que não são acentuadas graficamente. Também aqui se prevêem algumas facultatividades e casos de dupla acentuação.
 As palavras paroxítonas não são em geral acentuadas graficamente: enjoo, grave, homem, mesa, Tejo, vejo, velho, voo; avanço, floresta; abençoo, angolano, brasileiro; descobrimento, graficamente, moçambicano
Recebem, no entanto, acento agudo:
a) As palavras paroxítonas que apresentam, na sílaba tónica/tônica, as vogais abertas grafadas a, e, o e ainda i ou u e que terminam em -l, -n, -r, -x e -ps, assim como, salvo raras exceções, as respectivas formas do plural: amável (pl. amáveis), Aníbal, dócil (pl. dóceis), dúctil (pl. dúcteis), fóssil (pl. fósseis), réptil (pl. répteis; var. reptil, pl. reptis); cármen (pl. cármenes ou carmens; var. carme, pl. carmes); dólmen (pl. dólmenes ou dolmens), éden (pl. édenes ou edens), líquen (pl. líquenes), lúmen (pl. lúmenes ou lúmens); acúcar (pl. açúcares), almíscar (pl. almíscares), cadáver (pl. cadáveres), caráter ou carácter (mas pl. carateres ou caracteres), ímpar (pl. ímpares); Ájax, córtex (pl. córtex; var. córtice, pl. córtices, índex (pl. índex; var. índice, pl. índices), tórax (pl. tórax ou tóraxes; var. torace, pl. toraces); bíceps (pl. bíceps; var. bicípite, pl. bicípites), fórceps (pl. fórceps; var. fórcipe, pl. fórcipes).
Obs.: Muito poucas palavras deste tipo, com a vogais tónicas/tônicas grafadas e e o em fim de sílaba, seguidas das consoantes nasais grafadas m e n, apresentam oscilação de timbre nas pronúncias cultas da língua e, por conseguinte, também de acento gráfico (agudo ou circunflexo): sémen e sêmen, xénon e xênon; fêmure fémur, vómer e vômer; Fénix e Fênix, ónix e ônix.
b) As palavras paroxítonas que apresentam, na sílaba tónica/tônica, as vogais abertas grafadas a, e, o e ainda i ou u e que terminam em -ã(s), -ão(s), -ei(s), -i(s), -um, -uns ou -us: órfã (pl. órfãs), acórdão (pl. acórdãos), órgão (pl. órgãos), órgão (pl. órgãos), sótão (pl. sótãos); hóquei, jóquei (pl. jóqueis), amáveis (pl. de amável), fáceis (pl. de fácil), fósseis (pl. de fóssil), amáreis (de amar), amaveis (id.), cantaríeis (de cantar), fizéreis (de fazer), fizésseis (id.); beribéri (pl. beribéris), bílis (sg. e pl.), íris (sg. e pl.), júri (di. júris), oásis (sg. e pl.); álbum (di. álbuns), fórum (di. fóruns); húmus (sg. e pl.), vírus (sg. e pl.).
Obs.: Muito poucas paroxítonas deste tipo, com as vogais tónicas/tônicas grafadas e e o em fim de sílaba, seguidas das consoantes nasais grafadas m e n, apresentam oscilação de timbre nas pronúncias cultas da língua, o qual é assinalado com acento agudo, se aberto, ou circunflexo, se fechado: pónei e pônei; gónis e gônis, pénis e pênis, ténis e tênis; bónus e bônus, ónus e ônus, tónus e tônus, Vénus e Vênus.
Não se acentuam graficamente os ditongos representados por ei e oi da sílaba tónica/tônica das palavras paroxítonas, dado que existe oscilação em muitos casos entre o fechamento e a abertura na sua articulação: assembleia, boleia, ideia, tal como aldeia, baleia, cadeia, cheia, meia; coreico, epopeico, onomatopeico, proteico; alcaloide, apoio (do verbo apoiar), tal como apoio (subst.), Azoia, hoia, boina, comboio (subst.), tal como comboio, comboias, etc. (do verbo comboiar), dezoito, estroina, heroico, introito, jiboia, moina, paranoico, zoina.
É facultativo assinalar com acento agudo as formas verbais de pretérito per­feito do indicativo, do tipo amámos, louvámos, para as distinguir das correspondentes formas do presente do indicativo (amamos, louvamos), já que o timbre da vogal tónica/tônica é aberto naquele caso em certas variantes do português.
Recebem acento circunflexo:
a) As palavras paroxítonas que contêm, na sílaba tónica/tônica, as vogais fecha­das com a grafia a, e, o e que terminam em -l, -n, -r, ou -x, assim como as respetivas formas do plural, algumas das quais se tornam proparoxítonas: cônsul (pl. cônsules), pênsil (pl. pênseis), têxtil (pl. têxteis); cânon, var. cânone (pl. cânones), plâncton (pl. plânctons); Almodôvar, aljôfar (pl. aljôfares), âmbar (pl. âmbares), Câncer, Tânger; bômbax(sg. e pl.), bômbix, var. bômbice (pl. bômbices).
b) As palavras paroxítonas que contêm, na sílaba tónica/tônica, as vogais fecha­das com a grafia a, e, o e que terminam em -ão(s), -eis, -i(s) ou -us: bênção(s), côvão(s), Estêvão, zângão(s); devêreis (de dever), escrevêsseis (de escrever) ,fôreis (de ser e ir), fôsseis (id.), pênseis (pl. de pênsil), têxteis (pl. de têxtil); dândi(s), Mênfis; ânus.                            
c) As formas verbais têm e vêm, 3ª­s pessoas do plural do presente do indicativo de ter e vir, que são foneticamente paroxítonas (respetivamente / tãjãj /, / vãjãj / ou / têêj /, / vêêj / ou ainda / têjêj /, / vêjêj /; cf. as antigas grafias preteridas, têem, vêem, a fim de se distinguirem de tem e vem, 3ª pessoas do singular do presente do indicativo ou 2ª pessoas do singular do imperativo; e também as correspondentes formas compostas, tais como: abstêm (cf. abstém), advêm (cf. advém), contêm (cf. contém), convêm (cf. convém), desconvêm (cf. desconvém), detêm (cf. detem), entretem (cf. entretém), intervêm (cf. intervém), mantêm (cf. mantém), obtêm (cf. obtém), provêm (cf. provém), sobrevêm (cf. sobrevém).
Obs.: Também neste caso são preteridas as antigas grafias de têem, intervêem, mantêem, provêem, etc.
Assinalam-se com acento circunflexo:
a) Obrigatoriamente, pôde (3ª pessoa do singular do pretérito perfeito do indicativo), no que se distingue da correspondente forma do presente do indicativo (pode).
b) Facultativamente, dêmos (1ª pessoa do plural do presente do conjuntivo), para se distinguir da correspondente forma do pretérito perfeito do indicativo (de­mos); fôrma (substantivo), distinta de forma (substantivo; 3ª pessoa do singular do presente do indicativo ou 2ª pessoa do singular do imperativo do verbo formar).
Prescinde-se de acento circunflexo nas formas verbais paroxítonas que contêm um e tónico/tônico oral fechado em hiato com a terminação -em da 3ª pessoa do plural do presente do indicativo ou do conjuntivo, conforme os casos: creem deem (conj.), descreem, desdeem (conj.), leem, preveem, redeem (conj.), releem, reveem, tresleem, veem.
Prescinde-se igualmente do acento circunflexo para assinalar a vogal tónica/tonica fechada com a grafia o em palavras paroxítonas como enjoo, substantivo e flexão de enjoar, povoo, flexão de povoar, voo, substantivo e flexão de voar, etc.
Prescinde-se, quer do acento agudo, quer do circunflexo, para distinguir palavras paroxítonas que, tendo respectivamente vogal tónica/tônica aberta ou fecha­da, são homógrafas de palavras proclíticas. Assim, deixam de se distinguir pelo acento gráfico: para (á), flexão de parar, e para, preposição; pela(s) (é), substantivo e flexão de pelar, e pela(s), combinação de per e la(s); pelo (é), flexão de pelar, pelo(s) (é), substantivo ou combinação de per e lo(s); polo(s) (ó), substantivo, e polo(s), combinação antiga e popular de por e lo(s); etc.
Prescinde-se igualmente de acento gráfico para distinguir paroxítonas homógrafas heterofónicas/heterofônicas do tipo de acerto (ê), substantivo, e acerto (é,), flexão de acertar; acordo (ô), substantivo, e acordo (ó), flexão de acordar; cerca (ê), substantivo, advérbio e elemento da locução prepositiva cerca de, e cerca (é,), flexão de cercar; coro (ó), substantivo, e flexão de corar; deste (ê), contracção da preposição de com o demonstrativo este, e deste (é), flexão de dar; fora (ô), flexão de ser e ir, e fora (ó), advérbio, interjeição e substantivo; piloto (ô), substantivo, e piloto (ó), flexão de pilotar, etc.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

LÍNGUA PORTUGUESA. Revista. São Paulo: Segmento, 2007. Ano II n. 21, julho de 2007.
PEREIRA, José. A Nova Reforma Ortográfica. Disponível em internet:       http://www.filologia org. br . Acesso em 04/04/2008
SILVA, Maurício. Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa - o que muda, o que não muda. São Paulo: Editora Contexto, 2008. 96 p.
VIEIRA, Jair Lot. Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. São Paulo: Edipro, 2008. 

O EMPREGO DO HÍFEN EM COMPOSTOS, LOCUÇÕES E ENCADEAMENTOS VOCABULARES DE ACORDO COM A NOVA REFORMA ORTOGRÁFICA.




* Natália Rodrigues Sousa.

            Este artigo tem por finalidade principal fazer um paralelo entre o uso do hífen em palavras compostas, locuções e encadeamentos vocabulares antes e depois da reforma ortográfica e com isso percebermos o que ficou igual e o que mudou com relação ao emprego desse sinal nessas palavras.
  
O presente trabalho apresenta as novas regras do emprego do hífen em palavras compostas, locuções e encadeamentos vocabulares de acordo com a reforma ortográfica que já foi aprovada e deve entrar em vigor em 1º de Janeiro de 2009. Ao longo desse artigo vamos notar em quais palavras podemos usar ou não o hífen e também percebermos se as novas normas ajudarão ou não o aluno a empregar corretamente o mesmo, uma vez que há inúmeras regras e que acaba muitas vezes nos confundindo.
Segundo o dicionário Luft (2001,p.368), o hífen é: “Tracinho (-) usado para sinalizar palavras compostas (amor-perfeito), unir pronomes átonos a verbos (dar-te, dar-te-ei) e separar palavras em mudanças de linha (língua-/gem)”. As palavras compostas de acordo com Campedelli e Souza (2001,p.439) são: “ Consiste na formação de vocábulos mediante a reunião de dois ou mais radicais em um só todo, com significação própria”. Dessa forma, as palavras compostas são aquelas que têm mais de um componente com significado independente em sua formação. Conforme a Wikipédia (2008) a locução é: “Locução é uma frase ou  um grupo de palavras que equivale a uma palavra”. Já os encadeamentos vocabulares são seqüências de palavras que podem vir ou não acompanhados por hífen, como por exemplo: pé-de-moleque, planalto.

O emprego do hífen antes da reforma ortográfica
Segundo Maia (2003, p.20), o emprego do hífen é matéria extremamente complexa e mal disciplinada pelo Pequeno Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, sobretudo no que diz respeito ao uso desse sinal em palavras formadas por prefixação. Para quem escreve, o emprego do hífen é um autêntico quebra-cabeça. Vejamos os casos em que podemos usar o hífen:
Em compostos cujos elementos conservam sua autonomia fonética e acentuação própria, mas perderam sua significação individual para constituir uma unidade semântica, um conceito único, como por exemplo: água-marinha, guarda-pó, quinta-feira, corre-corre, sempre-viva, água-de-colônia, capitão-de-mar-e-guerra.
Podemos usá-lo para ligar pronomes enclíticos e mesoclíticos a formas verbais, à palavra “eis” e aos pronomes “nos” e “vos”, como nos seguintes exemplos: vê-los-ás, dir-se-ia, dava-se-lhe, ei-lo, no-lo, amá-la.
Empregamos esse sinal nos adjetivos compostos: anglo-latino, sino-japonês, rio-grandense, mato-grossense, verde-amarelo, à-toa, cor-de-rosa, sem-vergonha, sem-par. Utilizamos também em vocábulos formados pelos sufixos açu, guaçu, mirim, se o elemento anterior acaba em vogal acentuada (andá-açu, sabiá-guaçu, cajá-mirim) ou quando a pronúncia o exige (capim-açu).
Usamos o hífen nos compostos de bem, sendo que é antes de palavras que têm vida autônoma e quando a pronúncia o requer, como bem-querer, bem-vindo, bem-estar, bem-amado, bem-aventurado. Ainda o empregamos em vocábulos formados por prefixos que têm acentuação própria (tônicos) ou evidência semântica, como nos seguintes exemplos: recém-nascido, sem-cerimônia, pré-escolar, além-mar.
Vejamos agora os casos em que não podemos empregar o hífen:
Não usamos esse sinal sempre que se obliterou a consciência da composição da palavra, o que acontece quando um elemento se adaptou foneticamente ao vizinho ou perdeu a sua vida autônoma, como: aguardente, girassol, madrepérola, sobremesa.
Vale ressaltar que não o utilizamos quando o prefixo pode ser aglutinado sem prejuízo da clareza ou sem promover pronúncias errôneas, como em: subdiretor, aeroporto, bioquímico, anticomunista, antevéspera, superlotado, semibárbaro. Também não o usamos nas locuções, como por exemplo: um a um, de vez em quando, à toa, a fim de.  
Notamos ainda que não podemos empregá-lo em expressões do tipo: estrada de ferro, doce de leite, cor de café, anjo da guarda, relógio de bolso, farinha de trigo e também com o radical “rádio”: rádio ouvinte, radiopatrulha, radiocomunicação.
Podemos perceber que são muitos os casos em que podemos ou não utilizar o hífen, por isso para sabermos usá-lo, é preciso estarmos atentos às regras.

O emprego do hífen depois da reforma ortográfica.

O novo acordo ortográfico estabeleceu novas regras sobre o uso do hífen, entre elas está o uso do mesmo em palavras compostas, locuções e encadeamentos vocabulares. Vejamos o que José Pereira (2008) afirma a respeito do emprego do hífen nessas palavras:

Emprega-se o hífen nas palavras compostas por justaposição que não contém formas de ligação e cujos elementos, de natureza nominal, adjetiva, numeral ou verbal, constituem uma unidade sintagmática e semântica e mantêm acento próprio, podendo dar-se o caso de o primeiro elemento estar reduzindo: ano-luz, arce-bispo, arco-íres, decreto-lei, és-sueste, médico-cirurgião, rainha-Cláudia, tenente-coronel, tio-avô, turma-piloto, alcaide-mor, amor-perfeito, guarda-noturno, mato-grossense, norte-americano, porto-alegrense, sul-africano, afro-asiático, cifro-luso-brasileiro, azul-escuro, luso-brasileiro, primeiro-ministro, primeiro-sargento, primo-infeção, segunda-feira, conta-gotas, finca-pé, guarda-chuva.

Podemos notar que essas regras em palavras compostas que têm unidade sintagmática e semântica e acento próprio continuam igual às regras anteriores, não mudou o emprego do hífen nessas palavras.
José Pereira afirma que não usamos hífen em palavras compostas que não têm mais sentido de composição, como por exemplo: girassol, madressilva, mandachuva, pontapé, paraquedas, paraquedista. Nesse caso essas palavras sofrem o processo de aglutinação, ou seja, os radicais se modificam e se fundem de tal maneira que a composição fica aparente irreconhecível.
Empregamos o hífen segundo o autor nos topônimos/ topônimos compostos que  começam pelos grã, grão, e também em  formas verbais e ainda em palavras unidas por artigo, como por exemplo: Grã-Bretanha, Grão-Pará, Abre-Campo, Passa-Quatro, Quebra-Costas, Quebra-Dentes, Traga-Mouros, Trinca-Fortes, Baía de Todos-os-Santos, Entre-os-Rios, Montemor-o-Novo, Trás-os-Montes. Entretanto existem topônimos/topônimos compostos que não usamos hífen, como América do Sul, Belo Horizonte, Cabo Verde, Castelo Branco, Freixo de Espada à Cinta. Mas o topônimos/topônimos Guiné-Bissau não segue essa regra,  sendo portanto, grafado por hífen.
Usamos o hífen, conforme o autor, nas palavras compostas que indicam espécies botânicas e zoológicas que estejam ou não unidas por preposição ou qualquer outro elemento, como: abóbora-menina, couve-flor, erva-doce, feijão-verde, benção-de-deus, erva-do-chá, ervilha-de-cheiro, fava-de-santo-inácio, bem-me-quer, andorinha-grande, cobra-capelo, formiga-branca, andorinha-do-mar, cobra-d’água, bem-te-vi.  
O autor fala que utilizamos esse sinal, ou seja o hífen, nos compostos com os advérbios “bem” e “mal”, quando os mesmos formam com o elemento que se lhes segue uma unidade sintagmática e semântica e tal elemento começa por vogal ou h. porém o advérbio bem, ao contrário de mal, pode não se aglutinar com palavras começadas por consoante. Veja os exemplos: bem-aventurado, bem-estar, bem-humorado, mal-afortunado, mal-estar, mal-humorado, bem-criado, (malcriado), bem-ditoso, (malditoso), bem-falante, (malfalante). Podemos perceber que quando bem é o contrário de mal se a palavra é iniciada por consoante não usamos hífen.
Vale comentar que em muitos compostos, o advérbio bem aparece aglutinado com o segundo elemento, quer este tenha ou não vida à parte, nesse caso não usamos hífen, como nos exemplos: benfazejo, benfeitor, benquerença.
De acordo com José Pereira empregamos o hífen nos compostos com os elementos além, aquém, recém, e sem: além-Atlântico, além-mar, além-fronteiras, recém-casado, recém-nascido, sem-número, aquém-fiar. Percebemos que o uso do hífen com esses elementos continua igual à norma anterior.
Não se emprega em geral o hífen nas locuções de qualquer tipo, quer sejam elas substantivas, adjetivas, pronominais, adverbiais, prepositivas ou conjuncionais, mas há algumas exceções nas quais podemos usá-la como é o caso de água-de-colônia, arco-da-velha, cor-de-rosa, mais-que-perfeito, pé-de-meia, ao deus-dará, à queima-roupa.
Vejamos os seguintes exemplos de emprego sem hífen nas locuções:
Na substantivas: cão de guarda, fim de semana, sala de jantar. Nas adjetivas temos: cor de açafrão, cor de café com leite, cor de vinho. Nas pronominais: Cada um, ele próprio, nós mesmos, quem quer seja. Nas adverbiais: à parte, à vontade, depois de amanhã, em cima, por isso. Nas prepositivas: abaixo de, acerca de, acima de, afim de, apesar de, por cima de. E ainda nas conjuncionais: afim de que, ao passo que, logo que, visto que.
O hífen é empregado ainda para ligar duas ou mais palavras que ocasionalmente se combinam, formando encadeamentos vocabulares, temos como exemplos: a divisa Liberdade-Igualdade-Fraternidade, a ponte Rio-Niterói, a ligação Angola-Moçambique, e também nas combinações históricas ou ocasionais de topônimos/topônimos como Áustria-Hungria, Angola-Brasil, Tóquio-Rio de Janeiro.

Conclusão

Podemos perceber que a nova reforma ortográfica trouxe muitas mudanças para a nossa língua portuguesa, como por exemplo: o trema deixará de existir, sendo que ele só vai ser usado em nomes próprios, o acento agudo não será mais usado em palavras terminadas em eia e oia, como ideia, assembleia, jiboia, os verbos crer, dar, ler e ver, não terão mais acento circunflexo nas terceiras pessoas do plural do presente do indicativo ou do subjuntivo, ficando portanto, da seguinte maneira: creem, deem, leem e vêem.  No caso do emprego do hífen em palavras compostas, locuções e encadeamentos vocabulares as regras continuam iguais às normas anteriores. Logo não teremos dificuldades em usar o hífen, basta ficarmos atentos.

Referências Bibliográficas

CAMPEDELLI, samira yousseff; SOUZA, Jésus Barrosa. Português: Literatura, Produção de Textos e Gramática. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001.
Dicionário Luft. Brasília: Ática, 2001.              

MAIA, Raul. Educa: Programa de Estudo e Pesquisa: Gramática Normativa. São Paulo: Difusão Cultural do Livro, 2003.

PEREIRA, José. A nova reforma ortográfica. Disponível em Internet: http: //WWW.filologia.org.br. Acessado em 11/5/2008.

WIKIPÉDIA, http://pt.wikipedia.org/wiki/m%c3%a9todo.  Acessado em 7/9/2008

O ENSINO DE ORTOGRAFIA: UM DESAFIO QUE PODE SER VENCIDO


Viviane Silveira Mapurunga[1][2]


              No presente artigo, traçamos uma análise sobre o ensino de ortografia para alunos do Ensino Fundamental. Objetivamos, com esse estudo, propiciar aos referidos educandos  subsídios para a aprendizagem prazerosa, e não cansativa, das regras ortográficas, bem como, aos educadores, uma orientação no que diz respeito ao ensino da ortografia, possibilitando um melhor rendimento de seus alunos. Um estudo empírico foi realizado para que, diante da dificuldade do aluno em transcrever algumas palavras, o educador possa se utilizar de recursos facilitadores para trabalhar as alterações ortográficas encontradas na escrita de seus alunos. As obras de Jean Piaget, Vicente Barbera Albalat, Artur Gomes de Morais, Mirim Lemle, entre outros, foram de fundamental importância para a pesquisa bibliográfica. No estudo empírico, tivemos como suporte teórico a obra de Jaime Luiz Zorzi. Para maior compreensão do nosso trabalho, fizemos uma divisão em três partes. Na primeira, base teórica desta pesquisa, dividimo-la em três subcapítulos, onde discorremos sobre a evolução da língua escrita, sua importância enquanto convenção ortográfica, e sua aquisição pela criança. Na segunda parte, apresentamos uma pesquisa de campo onde  constatamos as principais alterações ortográficas existentes na escrita dos alunos da 4ª e 5ª séries do Ensino Fundamental da Escolinha Rainha da Paz, localizada na cidade de Sobral. Na terceira parte, sugerimos algumas das principais técnicas e estratégias do ensino de ortografia. Esta pesquisa permitiu-nos concluir que, por mais que pareça difícil, é possível ensinar ortografia ligando-a aos interesses dos alunos.
Palavras-chave: Ensino de ortografia. Aprendizagem. Aquisição da escrita.

ABSTRACT
In this essay we point na analysis out as to the teaching of orthography for students of Fundamental Schooling. This way, we aim to furnish to these students subsidies for a pleasant but not wearisome apprenticeship of the orthographical rules, as well as for teachers some orientation in orthography training, which may enable better results for the students. An empiric study was made so that, before the students` difficulties in transcribing some words, the teachers may use resources that make easier to work on orthographical anterations occurring in their students` writings. The works by Jean Piaget, Vicente Barbera Albalat, Artur Gomes de Morais, Mirim Lemle and others have been very important to the bibliographical research. In our empiric study we`ve made a division in three suchapters, in which we discourse about the evolution of write ten language, its importance as orthographical convention, as well as its acquisition by the children. In the second part we present a local research in which we`ve found the main orthographical alterations that occur in the students` writings of the 4th and 5th year of Elementary Education of the “ Escolinha Rainha da Paz” in Sobral City. In the third part we suggest someones of the principal techniques and strategies for orthography learning. This research permits us to conclude that, however it may seem difficult, it is possible to teach orthography attached to the students` interests.
Key-words: Teaching of orthography. Apprenticeship. Acquisition of writing.


INTRODUÇÃO

O propósito dessa pesquisa está ligado às situações difíceis encontradas pelos educandos no que se refere às questões de grafia de certas palavras, principalmente aquelas que têm sua correspondência letra/som irregulares.
Muitos professores sentem-se inseguros ao cobrarem a ortografia de seus alunos devido a falta de conhecimento necessário para fazê-lo. Diante dessa problemática encontrada em nossa educação, faz-se necessário um trabalho de investigação a fim de possibilitar alternativas para que o professor tenha êxito na difícil, mas não impossível, tarefa de ensinar ortografia. Alternativas que correspondam às reais necessidades encontradas nas salas de aula e que levem os alunos a experimentarem uma maneira diferente, progressiva do aprendizado.
A metodologia escolhida para este trabalho foi a bibliográfica, através das obras de Artur Gomes de Morais, Mirim Lemle, Vicente Barbera Albalat, Jean Piaget, entre outros, como também uma pesquisa de campo, onde fizemos uso do “Roteiro de Observação Ortográfica”, de Jaime Luiz Zorzi.
Através desse estudo, observamos que a forma de cobrar a correção ortográfica, muitas vezes, é realizada de forma repetitiva, mecânica, sem a utilização das regras gramaticais, sem valorizar o acerto das respostas, sem incentivar comentários, fazendo com que o aluno, ao invés de prazer, tenha um sentimento de repulsa ao escutar palavras como ditado e redação. E que dessa forma é impossível obter um diagnóstico preciso para o aprimoramento da escrita.
No último momento deste trabalho, apresentamos técnicas e estratégias didáticas a fim de favorecer o ensino e, principalmente, a aquisição da escrita ortográfica.



1.      FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
1.1 A evolução da língua escrita
Para chegar até a palavra escrita, como a que hoje usamos, o ser humano precisou percorrer um longo caminho. Sabemos que há quarenta mil anos o homem não apenas existia, ele pensava e também desenvolvia qualidades artísticas, pois fazia diversas pinturas nas paredes das cavernas, tais como cavalos, touros, etc, o que conhecemos como escrita pictográfica (CAGLIARI, 1992).
A princípio, esses trabalhos artísticos eram feitos no fundo das cavernas, e não na entrada, onde os homens tinham maior acesso. Por isso, o homem pensava que essas figuras possuíam um significado mágico. Mais tarde foram surgindo tipos de desenhos que comunicavam alguma coisa. Era uma tentativa de escrita, embora fosse muito simples.
Com o passar do tempo, a escrita foi se transformando. O ser humano precisava escrever coisas mais completas. Pouco a pouco, as pessoas foram se habituando a escrever e, com isso, veio a simplificação dos símbolos, para que o que fosse escrito tivesse a compreensão de todos. Esses desenhos especiais recebem o nome de ideogramas. À proporção que o tempo ia passando, os símbolos iam se simplificando cada vez mais. As letras do nosso alfabeto vieram desse tipo de evolução (CAGLIARI, 1992).
A primeira escrita dos babilônios era bem codificada, feita em lajota de barro mole para escrever e um pequeno bastão em madeira ou ferro. Pela dificuldade de escrever linhas curvas de barro, passaram a fazer “marcas” na argila. Para fazê-lo usavam um estilete de ponta triangular – a cunha. Este processo de escrita denominou-se cuneiforme.
Os egípcios inventaram uma escrita que era gravada sobre a pedra. Por mais trabalhoso que fosse, qualquer tipo de documento escrito possuía uma durabilidade eterna; característica forte da cultura egípcia, que dava grande importância a durabilidade das coisas.
Cagliari (1992) afirma que os gregos criaram o sistema de escrita alfabética, que apresenta um inventário menor de símbolos e permite a maior possibilidade combinatória de caracteres na escrita. Posteriormente, a escrita grega foi adaptada pelos romanos, e esta forma modificada constitui o sistema alfabético greco-latino, de onde provém o nosso alfabeto. Os gregos modelaram as letras e estabeleceram as regras de escrever conhecidas até hoje, da esquerda para a direita, ao contrário das outras línguas semíticas. Também introduziram o uso das vogais.
O sistema de escrita do português usa vários tipos de alfabeto, apesar disso não é totalmente alfabético, usando além de letras, outros caracteres de natureza ideográfica como os sinais de pontuação e os números.
A relação entre as letras e os sons da fala é sempre muito complicada pelo fato de a escrita não ser o espelho da fala e porque é possível ler o que está escrito de diversas maneiras. Por isso, muitas vezes usamos recursos especiais da escrita para representar alguns sons da fala, como o caso da utilização de duas letras para representar um som (dígrafos). Cagliari (1992, p.117) diz que: “É uma ilusão pensar que a escrita é um espelho da fala. A única forma de escrita que retrata a fala, de maneira a correlacionar univocamente letra e som, é a transcrição fonética”.
Usamos também letras que não têm som nenhum na fala, mas que estão presentes na escrita, como letras que podem estar relacionadas com diferentes segmentos fonéticos ou segmentos fonéticos que podem ser representados por diferentes letras.
Na escrita do português existem também alguns sinais gráficos que conferem um valor sonoro especial as letras ou a conjuntos de letras; são os chamados sinais diacríticos: acento agudo, acento grave, til, acento circunflexo, trema e, ainda, ponto de interrogação, ponto de exclamação, ponto final, reticências, aspas, etc, sendo que estes últimos são sinais modificadores da entonação da fala.
No Brasil, o ensino da escrita passou por várias etapas e foi fortemente influenciado pela pedagogia tradicional, de caráter religioso e normativo, dada a influência dos jesuítas, nessa área.
A escrita, em tempos passados, era privilégio de sacerdotes e nobres; para nós, nos dias atuais, é necessidade e direito de todos. A escrita, que serve de comunicação entre os homens, é usada desde a declaração de um sentimento até o fechamento de um importante negócio. A escrita, seja ela qual for, sempre foi uma maneira de representar a memória coletiva religiosa, mágica, científica, política, artística e cultural de um povo.

1.2 A importância da convenção ortográfica

Em muitas salas de aula professores se deparam com perguntas do tipo: “Para que aprender essas regras de ortografia se o importante é o outro entender o que eu escrevi?” O próprio educador, muitas vezes, fica sem resposta ou dá uma resposta que não convence nem a ele mesmo.
Albalat (1991, p.03) comungava do mesmo questionamento quando argumentou: “Mas, a final, a hortografia é inportante? Trata-se de uma questão ecenssial ou é uma criassao da mente umana para conplicar as coizas e dificultar o asseço ao conhecimento? Trata-se de uma comsecuência da expecialisação ou só serve para xatear?”.
Na verdade, normas gramaticais são de suma importância para a manutenção da unidade da língua, pois a fala vive passando por transformações. Como diz Cagliari (1997, p. 115): “A fala se modifica em função do tempo e do espaço”.
Outro aspecto importante a ressaltar é o de que as regras ortográficas são fruto de uma convenção social, de um acordo estabelecido pelos especialistas, cujo objetivo é padronizar a escrita, mantê-la íntegra, ou seja, se esse objetivo não se realizasse, a linguagem escrita apareceria, dentro de um mesmo país, fragmentada pela oralidade de cada região e pelo modo de pronunciar de cada falante. Seria uma verdadeira Torre de Babel, pois, com o passar do tempo, ninguém se entenderia mais. Essa seria a real necessidade de se respeitar as convenções ortográficas.

1.3 A aquisição da escrita pela criança e sua evolução a partir da escola

A aquisição da escrita pela criança tem início quando lhe é dada a oportunidade de desenhar, criar histórias, registrar idéias e interpretar as diferentes formas de escrita encontradas em objetos do cotidiano, fazendo com que desde o início ela se sinta produtora de textos. Mesmo aquelas que não sabem escrever convivem com uma série de textos impressos em diferentes objetos e lugares e participam de inúmeras situações em que a escrita está presente.
O aprendizado da notação alfabética se realiza quando a criança tem domínio da convenção letra/som tal como está restringida pelo sistema alfabético. Entretanto, somente depois dessa fase, a criança poderá iniciar a aquisição da norma propriamente dita. A esse respeito, Morais (2003, p.14) afirma que “Embora a criança já se depare com dúvidas ortográficas em fases iniciais da aquisição da escrita, em geral é só depois de escrever alfabeticamente que ela tende a apropriar-se de modo sistemático da norma ortográfica”.
Apresentamos, a seguir, uma pesquisa de Mirim Lemle (1991) que aponta os caminhos que a criança do Ensino Fundamental percorre para que se realize a aprendizagem da escrita normativa:
O primeiro passo do alfabetizando em sua compreensão do sistema de escrita é o casamento monogâmico entre sons e letras, ou seja, o entendimento da situação ideal e perfeita de que cada letra tem seu nome e cada som tem sua letra.
O segundo passo é a teoria da poligamia com restrições de posição. Consiste na rejeição da hipótese da monogamia. É onde o aprendiz percebe que há palavras em que o som da letra l não é [l] e sim [u], que a letra r corresponde a um som forte em início de palavra e a um som brando quando colocada entre duas vogais.
                    O terceiro passo diz respeito às partes arbitrárias do sistema. É o momento em que o aluno sente insegurança sobre a ortografia correta de uma palavra. Quando mais de uma letra pode, na mesma posição, representar o mesmo som. A opção pela letra correta em uma palavra é, em termos puramente fonológicos, inteiramente arbitrária. É o caso da palavra rosa que se escreve com s. Pelas regras de distribuição de sons e de letras em português poderia igualmente ser aceita com z, do mesmo modo, exame poderia igualmente ser escrita com s, ou com z.
No quarto passo, o aluno percebe as regularidades ligadas a morfologia das palavras. É o caso, por exemplo, da palavra beleza que é escrita com z e está numa posição de concorrência com s. Assim, pelo som, podia se escrever belesa. Entretanto sabendo que o sufixo –eza, que forma substantivos a partir de adjetivos, é escrito com z e não com s permite acertar automaticamente a escrita da palavra ao se conhecer o sufixo.
Diante dessa longa trajetória, resta-nos afirmar que a tarefa do aprendiz de ortografia é multifacetada. Esse é também o pensamento de Morais (2003, p15) quando diz:

 O aprendiz de ortografia deve apropriar-se das restrições irregulares e regulares socialmente convencionadas, de modo a gerar não só a escrita de palavras, mas a escrita correta de palavras. Mesmo dentro do que chamamos casos regulares há peculiaridades: ora o aprendiz precisa refletir sobre a categoria gramatical da palavra, ora precisa atentar para a posição do segmento sonoro dentro da palavra, ora precisa observar a tonicidade do segmento.


A ação pedagógica, diante desse processo, deve ser realizada respeitando as etapas pelas quais a criança percorre, promover atividades que permitam que ela avance de uma etapa para outra. Em alguns casos o professor deverá incentivar conflito, mas em todas as vezes ele deverá fornecer diversas oportunidades de aprendizado.

2. A PESQUISA DE CAMPO

O estudo em pauta foi realizado durante a disciplina Fonologia e Ortografia do Português, desse Curso de Especialização, sob a orientação do Profº. Ms. Vicente Martins, através do “Roteiro de Observação Ortográfica”, de Zorzi (1998), aplicado para dez alunos da Escolinha Rainha da Paz, na cidade de Sobral, onde cinco destes cursam a 4ª série do ensino fundamental I e cinco a 5ª série do ensino fundamental II. O ditado de palavras, frases e texto foi aplicado em sala, obviamente, enquanto a redação ficou como exercício para casa. Apenas seis alunos fizeram a redação, sendo três da 4ª série e três da 5ª série. Consideramos as amostras  suficientes para nosso trabalho.
Nosso objetivo com esse estudo não é apontar erros, pois sabemos que com a variação da linguagem oral surge a dificuldade para se fixar uma notação escrita única para as palavras de uma língua. Nosso propósito, no entanto, é constatar as principais dificuldades encontradas para, a partir daí, fazer um diagnóstico a fim de melhorar o padrão ortográfico do educando.

2.1 Resultados e discussão

Conforme o ditado de palavras, podemos observar, na tabela que veremos a seguir, algumas alterações ortográficas bastante significativas. Com relação ao ditado de frases e textos, encontraremos também, além de alterações comuns, “erros” com relação ao emprego de iniciais maiúsculas e dos sinais de pontuação.    
Verificaremos que os alunos da 4ª série têm mais habilidades com a ortografia do que os que estão na série seguinte. Vale salientarmos aqui que os alunos da 4ª série estudam pela manhã, enquanto os da 5ª série à tarde. Conforme redação de um dos alunos da 5ª série que analisaremos, poderemos perceber que, além do estudo, eles têm outras preocupações que tiram um tempo precioso do aprendizado.
            Segundo Zorzi (1998, p. 34), “as alterações ortográficas podem ser classificadas através de 10 categorias, mais comumente encontradas na escrita das crianças em geral”. Utilizando essas categorias, no ditado de palavras, frases, textos e redação, as palavras onde podemos encontrar alterações estão representadas por cores. Para cada alteração foi dada uma cor distinta para uma melhor compreensão do observador.

ALTERAÇÕES ORTOGRÁFICAS

- Alterações ou erros decorrentes da possibilidade de representações múltiplas (o que podemos perceber, claramente, nas palavras que envolvem a grafia dos fonemas /s/, /z/, /∫/, /g/, /r/ etc. que geram uma certa confusão pelo fato de não haver formas fixas ou únicas de representação destes sons.
 

 - Alterações decorrentes do uso das letras m e n para indicar a nasalidade das vogais nasais.

- Alterações ortográficas decorrentes de apoio na oralidade, ou seja, aquelas palavras grafadas erroneamente devido a um apoio no modo de falar.

- Omissões de letras (palavras grafadas de modo incompleto em    função da omissão de uma ou mais letras).

- Alterações decorrentes de confusão entre as terminações am e ão.

- Generalização de regras (a forma da pronúncia chega a confundir a criança no momento da escrita).

- Alterações caracterizadas por substituições envolvendo a grafia de fonemas surdos e sonoros.

                     - Acréscimo de letras.

                     - Casos de duas alterações ortográficas em uma mesma palavra.

- Alterações caracterizadas por junção ou separação não convencional das palavras.

                     - Inversão de letras.

FRASES (amostras)

1-     Vovó Esté: dava conselho não queria que nimgem sofrese.

Podemos verificar nessa frase omissões de letras, alterações decorrentes do uso das letras m e n para indicar a nasalidade das vogais nasais, alterações decorrentes da possibilidade de representações múltiplas, sem falar no emprego errôneo dos sinais de pontuação.

2-      i ugalu a prendeu qui pai não tem nada qui fica mando no farze as couza por que to co prequissa di levanta.

Nessa frase encontramos alterações ortográficas decorrentes de apoio na oralidade, omissão de letras, alterações caracterizadas por junção ou separação não convencional das palavras, inversão de letras, alterações caracterizadas por substituições envolvendo a grafia de fonemas surdos e sonoros e alterações decorrentes da possibilidade de representações múltiplas.




DITADO DE PALAVRAS
COLUNA 1











ANA
CARLA
JOÃO
PEDRO
EDSON
FRANCISCO
VICENTE
CARLOS
JOSÉ
MARIA











CAÇADOR





CASSADOR
CASADO


CASADOR
CARROÇA



CAROÇA


CARROÇO

CARROSA
CARROSA
TRAVESSEIRO






TRAVESEIRO

TRAVESEIRO
TRAVISEIRO
CIMENTO


SIMENTO







QUEIXO


QUEIJO
QUEIJO
QUEIJO

QUEICHO
QUEICHO
QUEICHO
QUECHO
GELATINA



JELATINA






GIRASSOL


GIRASOL
GIRASOL

GIRASOL
GIRASOL
GIRASOSOL

GIRASOL
COMPRARAM





COMPRARÃO
COMPRARÃO

COMPRARÃO
CONPRARAM
SOLTOU

SOUTOU
SOUTOU
SOULTOU

SOUTOU
SOUTOO


SOUTOU
TANQUE



TAQUE

TANQUI
TANK



QUEIMAR





QUEIMA




SERVIÇO





SERVISSO



SERVISSO
EXEMPLO





EXEPLO
EXENPLO


EXENPLO











DITADO DE PALAVRAS
COLUNA 2











ANA
CARLA
JOÃO
PEDRO
EDSON
FRANCISCO
VICENTE
CARLOS
JOSÉ
MARIA
EXPLICAÇÀO 










ASSALTOU

ASAUTOU
ASSAUTOL
ASAUTOU


ASAUTOU
ASSAUTOL


ZELADOR





SELADOR




VIZINHO






VEZINHO



MACHUCADO



MACHOCADO






TIJOLO



TICHOLO





TIGOLO
JORNAL










VIAJARÃO
VIAJARAM
VIAJARAM





VIAJARAM

VIAGARAM
QUENTE





QUENTI


QUENTI
QUENTI
MANGUEIRA










MACARRÃO



MACARÃO




MACARÃO

CANTARÃO







CANTARAM

CANTARRÃO
QUATROCENTOS





QUATROCENTO
QUALTROCENTOS


QUATRUCENTOS

















DITADO DE PALAVRAS
COLUNA 3











ANA
CARLA
JOÃO
PEDRO
EDSON
FRANCISCO
VICENTE
CARLOS
JOSÉ
MARIA











FAZER










PRESENTE



PREZENTE

PREZENTI


PRESENTI

CHURRASCO



CHURASCO





CHURASCO
ENXUGAR
ENCHUGAR
ENCHUGAR

ENCHUGAR

ENCHUGA
ENCHUGAR
ENCHUGAR
ENCHUGAR
EMCHUGAR
MANCHAR





MANCHA




BANDEJA







BANDEIJA


COMERÃO
COMERAM
COMERAM





COMERAM
COMERAM

FALARAM





FALARÃO
FALARÃO


FALARRÃO
GUERRA










SANGUE





SAMGUE


SANGUI
SAGUE
COMBINAR
CONBINAR
CONBINAR



COMBINA
CONBINAR


CONBINAR
ESTUDAM






ESTUDÃO


ESTUDÃO
BOMBEIRO






BOMBERO


BONBEIRO









































                    *Os nomes constantes nesta tabela são fictícios, para preservar a identidade dos alunos.



3. SUGESTÕES DE TÉCNICAS E ESTRATÉGIAS DE ENSINO DA ORTOGRAFIA

Diante das alterações ortográficas mostradas no capítulo anterior, cabe ao professor advertir sua sala de que a escrita não é um espelho da fala; orientar seus alunos para o uso do dicionário em suas produções de texto;  fazer ditados com o objetivo de levar os alunos a verificarem a alteração cometida através de uma pauta de autocorreção, onde através das regras gramaticais eles mesmos possam constatar a falha, corrigindo-a. Isso fará com que o professor desenvolva na criança uma atitude de controle consciente do ato da escrita, de modo que ela possa, enquanto escreve, detectar as situações passíveis de erro, aplicando as estratégias de decisão a respeito de que letra deve ser usada.
O educador deve levar o aluno a segmentar palavras, realizando a produção forçada de fonema por fonema e, em seguida, fazer a correspondência letra a letra, como uma soletração: “Que som que tem, que letra que se escreve”. O aluno deve trabalhar com palavras que contenham mesmo som: listam-se as possibilidades de escrita e começa-se a verificar quais podem dar certo ou não, utilizando um procedimento de exclusão e de leitura do que ficaria escrito.
É dever do professor alertar os alunos de que, no mundo em que vivemos, quem não domina a convenção ortográfica é discriminado socialmente, todavia, não podemos adotar atitudes extremas diante do primeiro equívoco da criança. Tantas intervenções sem incentivos fazem a criança acabar achando que é incapaz de produzir algo corretamente. Para conseguir escrever corretamente ela terá um longo caminho a seguir. De acordo com Morais (2003, p.61): “É papel do professor ajudar a criança a refletir sobre os erros ortográficos. Só assim ela internaliza as regras que, por serem aparentemente complexas, vão desafiá-la por toda a vida”.
Para uma criança não adianta dizer que determinada palavra se escreve assim por ser de origem latina, descendente deste ou daquele radical ou de origem indígena. Na verdade isso só traria confusão para ela, uma vez que a mesma não sabe latim e muito menos um dialeto indígena. A melhor forma, nesses casos, é memorizar a forma correta através de listagens ou consultando o dicionário. Lourenço (2005, p.02) diz: “Deve-se deixar claro para os alunos que algumas palavras têm sua correspondência letra-som regulares, mas, em outros casos, são irregulares e, por sua vez, exigem memorização.”
O incentivo é a melhor maneira de se conseguir êxito com os alunos. Para que a aula se torne mais interessante cabe ao professor planejar, dinamizar, esforçar-se para que esses momentos sejam agradáveis: Atividades extra-sala como a observação da escrita de nomes de lojas, “outdoors”, placas, cartazes etc; aulas com a utilização de cartolina e pincel durante a correção de ditados, por exemplo, onde a cada constatação de alteração ortográfica, a regra seria copiada e afixada na parede a fim de ser consultada sempre que surgirem as mesmas dúvidas. Para Piaget (1973, p.89):

O bom experimentador deve, efetivamente, reunir duas qualidades muitas vezes incompatíveis: saber observar, ou seja, deixar a criança falar, não desviar nada, não esgotar nada e, ao mesmo tempo, saber buscar algo preciso, ter a cada instante uma hipótese de trabalho, uma teoria, verdadeira ou falsa, para controlar.

Na verdade, muitos são os recursos facilitadores para trabalhar as diversas alterações ortográficas encontradas na língua portuguesa escrita. Esperamos que as atividades propostas aqui possam suprir as dificuldades mais urgentes dos alunos que, prestativamente, participaram dessa pesquisa, sendo disponíveis na realização do ditado de palavras, frases e texto, como dos seis que, além do ditado, fizeram a redação em suas casas.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao fim desta pesquisa, concluimos que, entre outras deficiências com relação à ortografia, a maior dificuldade encontrada pelo aluno diz respeito à transcrição de palavras que apresentem letras com o mesmo som. Isso se dá porque o aluno sente a necessidade de escrever de acordo com a pronúncia da palavra, e porque ele não tem a maturidade suficiente de fazer uma associação do som à escrita, pois sabemos que a forma culta exige o conhecimento de algumas regras que são fundamentais para a grafia correta.
A maior dificuldade por parte dos professores diz respeito à forma de ensinar as regras, ou a ausência destas, de maneira dinamizada, proporcionando momentos de prazer e descontração. É dever do educador, portanto, colocar-se no lugar do aluno, compreender como ele se sente diante das palavras desconhecidas. Para aquelas de correspondência letra/som regulares ficará fácil a compreensão, porém para os casos de irregularidade o professor deverá propor exercícios de memorização; para as que exigem regras, atividades para internalizá-las
 Recomendamos, portanto, que as técnicas e estratégias de ensino da ortografia, propostas nessa pesquisa, sejam utilizadas nas salas de aula como está acontecendo na Escolinha Rainha da Paz, que nos proporcionou a pesquisa de campo, e vem desenvolvendo o ofício de ensinar ortografia de uma maneira renovada e satisfatória, bem como subsídio para futuras pesquisas aplicadas, a fim de possibilitar a criação de outras formas de ensino apropriadas para a aprendizagem da ortografia no Ensino Fundamental.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS



ALBALAT, Vicente Barbera. La reforma ortográfica. Madri: Apuntes de Educacion,1991.


CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetização e Lingüística. São Paulo: Scipione, 1997.


LEMLE, Mirim. Guia teórico do alfabetizador. São Paulo: Ática, 1991.


LOURENÇO, Rosemeire Alves. Ortografia: como cobrar dos alunos? Net, São Paulo, 2005.Disponível em:
< http://www.Gestaouniversitária.com.br >. Acesso em: 23. Ago. 2007.


MORAIS, Artur Gomes de. “Escrever como deve ser”. In TEBEROSKY, Ana e TOLCHINSKY, Liliana. (orgs.). Além da alfabetização: a aprendizagem fonológica, ortográfica, textual e matemática. Tradução de Stela Oliveira. São Paulo: Ática, 2003.

MORAIS, Artur Gomes de. “Ortografia: este peculiar objeto de conhecimento”. In MORAIS, Artur Gomes. (org.). O aprendizado da ortografia. Belo Horizonte: Autêntica,2003.


PIAGET, Jean. A representação do mundo na criança. Rio de Janeiro: Record, 1973.


ZORZI, Jaime Luiz. Aprender a escrever: apropriação do sistema ortográfico. Porto Alegre: Artes Médicas,1998.





[1] Artigo apresentado à Universidade Estadual Vale do Acaraú como requisito parcial para obtenção do título de Especialista em Língua Portuguesa e Literatura, sob a orientação da Profª. Ms. Maria Elisalene Alves dos Santos.

[2] Aluna do Curso de Especialização em Língua Portuguesa e Literatura da Universidade Estadual Vale do Acaraú-UVA.